“Eu sou seu amigo, amigo dos seus pais, amigo dos pais dos seus pais”.
Henry Sobel
Era assim, num sotaque que talvez nunca saibamos se era mesmo de ator ou de personagem, que o querido Henry Sobel se dirigia aos frequentadores da Congregação Israelita Paulista, a CIP, sinagoga e instituição que, graças em grande parte a ele, virou sinônimo e referência de judaísmo no Brasil. Durante alguns anos, eu era um desses frequentadores e grande parte da minha “vida judaica” foi permeada pelos ensinamentos dele num portunhês característico.
Hoje, aos 75 anos, Sobel se foi, vítima de um câncer de pulmão. Ele vivia em Miami, nos EUA, que não era sua terra natal (ele nasceu em Portugal), mas para onde sua família se mudou quando ele era ainda criança e para onde ele voltou depois de se aposentar — e de um episódio que ameaçou manchar sua trajetória.

Mas Sobel não era só aquele personagem caricato, amigo de todo mundo, com cabelo rock’n’roll e a kipá aveludada que parecia sempre estar fora do lugar. Ele foi a voz judaica em um dos mais tristes e assustadores episódios da recente história brasileira, quando o jornalista Vladimir Herzog, o Vlado, foi morto pela ditadura militar e dado como suicida.
Ato ecumênico
Sobel enfrentou a versão oficial, organizou com outros líderes religiosos um ato ecumênico na Catedral da Sé que foi um ponto de virada na ditadura. E, como rabino, se negou a enterrar Vlado na área do cemitério judaico reservada aos suicidas, como é tradicional. Descanse em paz, amigo.
Versão editada e ampliada de texto publicado originalmente no Instagram. Foto de capa: GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO/BBC),