
O assunto tem gerado muita polêmica. Faz uma semana hoje que os paulistanos precisam pisar no freio nas marginais Tietê e Pinheiros. A velocidade máxima, agora, passou de 90 km/h a 70 km/h na pista expressa. Na local, caiu de 60 km/h para 50 km/h e, na central, de 70 km/h para 60 km/h.
Quem é contra diz que o trânsito vai piorar. O argumento da Prefeitura de São Paulo para a medida é a redução de acidentes e, com eles, a diminuição do número de mortes no trânsito. O Brasil ocupa o infeliz 4º lugar entre os países que mais matam no trânsito, segundo a OMS. No mundo, acidentes são a principal causa da morte de jovens entre 15 e 29 anos. Em 2010, mais de 1,2 milhão de pessoas em todo o mundo morreram em acidentes de trânsito. No Brasil, em 2012, foram mais de 44 mil vítimas fatais.
Segundo um estudo da WRI Brasil-Embarq Brasil, um pedestre atropelado a 60 km/h tem 20% de chances de sobreviver. Se o atropelamento acontece a 50 km/h, a chance de sobrevivência sobe para mais de 50%. A 40 km/h, aumenta a chance de o veículo conseguir frear e evitar um atropelamento. De acordo com o estudo, uma redução de 5% na velocidade média pode resultar em 30% menos acidentes fatais.
“Em 2014, nas duas Marginais, ocorreram 1.180 acidentes com vítimas, com 1.399 pessoas feridas e 73 mortes”, explica a Prefeitura em seu site. Segundo a administração municipal, houve 504 acidentes com vítimas na Marginal Tietê no ano passado, com 645 feridos e 40 mortos. “Deste total, foram 54 atropelamentos, que feriram 43 pessoas e mataram outras 15″. Também no ano passado, a Marginal Pinheiros teve 580 acidentes com vítimas, com 754 feridos e 33 mortos. “Destes acidentes, foram 42 atropelamentos, que resultaram em 40 vítimas feridas e 10 mortas”.
Em 2012, na gestão Kassab da Prefeitura, a CET fez um estudo que revelou que a redução da velocidade em vias da cidade não aumentaria a lentidão. Do texto da Folha na época: “Estudo inédito da CET paulistana aponta que, quando o motorista diminui a velocidade máxima em uma via com trânsito intenso, os congestionamentos não aumentam”. Ainda segundo a CET, “a redução das velocidades máximas permitidas tem por objetivo a melhoria das condições de segurança de todos os usuários. A meta é reduzir o número alarmante de feridos e mortos em tais vias, com especial atenção aos mais vulneráveis: motociclistas, pedestres e ciclistas“.

A explicação é simples: “Quanto mais rápido um carro anda, maior a distância que ele tem que guardar do veículo à frente. Portanto, quanto maior a velocidade, mais espaço cada carro vai ocupar na via. Por outro lado, quando o trânsito está parado, um carro pode ficar colado ao outro. O maior fluxo possível ocorre quando todos os carros podem andar com segurança e cabe o maior número possível de veículos na via”. De fato, o estudo da CET de 2012 se provou correto na primeira manhã de nova velocidade nas marginais: o trânsito ficou abaixo da média na cidade.
Toda essa dicussão deveria levar em conta os únicos fatos que acabam sendo esquecidos: o respeito e a segurança dos envolvidos – pedestres, motoristas, motociclistas etc. Em um trânsito verdadeiramente decente e seguro para todos, esse tipo de discussão nem deveria existir. Reduzir a velocidade máxima permitida não é atrapalhar o trânsito. É defender a vida.
O exemplo que vem de fora. Aos que gostam de olhar para os exemplos internacionais, o estudo da Embarq Brasil mostra algumas cidades com diferentes limites de velocidade. Entre aquelas que limitam a 50 km/h, como Tóquio, Londres, Paris, Nova York e Chicago, morrem entre 1,7 e 5,9 pessoas a cada 100 mil habitantes. Nas cidades com velocidade de 60 km/h ou maior, como Miami, Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, Campinas, Brasília, Belo Horizonte, Fortaleza, Teresina e Goiânia, morrem entre 10 (Miami) e 29,8 (Goiânia) a cada 100 mil habitantes. Em São Paulo são 11,8 mortes no trânsito a cada 100 mil habitantes.
O que eu acho. Bom, tem pouco valor no debate, mas o que eu acho disso tudo é que quem é contra a redução é quem corre. Por isso o argumento mais ouvido é o “Isso é uma fábrica de multas”. Vai ser, mesmo, se os motoristas desrespeitarem os limites. Passei algumas vezes pelas marginais em horários tranquilos (tenho a sorte de não precisar dirigir em horários de pico) na última semana. São horários em que é possível correr. É necessário correr? Não é. A velocidade de 70 km/h é bastante aceitável. 50 km/h também!
Reproduzo um trecho do texto do Noblat sobre o assunto, porque ele explica bem a burrice do argumento contra a redução:
Se eu usar a pista expressa (da Marginal Tietê) hoje, em horário de trânsito livre, o percurso vai durar 15 minutos e 26 segundos. Se tivesse feito o trajeto na semana passada, percorreria o trecho em 12 minutos cravados. Portanto, o motivo de tanta da gritaria é o inaceitável acréscimo de 3:26 minutos. Entenderam? Confesso que não.
Para ler também:
Para onde vai São Paulo, a metrópole e seus caminhos (Estadão)
Prefeitura de SP tem 72 horas para explicar à Justiça novo limite das marginais (EBC, 24.jul.2015)
Marginais e imbecis (Blog do Noblat, O Globo, 23.jul.2015)
Velocidades mais baixas para cidades mais humanas e seguras (ANTP, 21.jul.2015)
1ª manhã de velocidade reduzida nas Marginais tem trânsito menor (Estadão, 20.jul.2015)
MP abre inquérito e OAB diz que vai à Justiça contra velocidade na Marginal (G1, 20.jul.2015)
Velocidade máxima das marginais será reduzida a partir de 20 de julho (CET, 8.jul.2015)
Redução de velocidade máxima não aumenta lentidão, diz CET (Folha, 24.mar.2012)
E aí, Gabriel? Faz tempo que a gente não se fala. Bem, gostaria de deixar minha opinião sobre o assunto, de alguém que costumava correr e hoje tenta se manter dentro dos limites.
São Paulo tem dois problemas em relação à velocidade: os que andam muito devagar e os que andam muito rápido. Os primeiros tendem a andar ainda mais devagar agora, o que não seria um problema se eles respeitassem a lei e andassem à direita, porém não é isso que acontece: eles ocupam qualquer faixa e dane-se quem quer andar mais rápido, mesmo que dentro do limite novo.
Já os segundos não foram afetados pela medida. Quem dirigia a 130 km/h nas marginais antes vai seguir andando a 130 km/h agora. E alguns dos que andavam a 90 km/h vai passar a andar a 130 km/h (“perdido por um, perdido por mil”). A localização dos radares nas marginais é notória, e aplicativos como o Waze costumam ajudar os esquecidos.
Assim, os novos limites de velocidade acabam não valendo para todos. Eu raramente pego as marginais em dias úteis (meu trajeto é de casa para a escola do meu filho de carro, e de lá para o escritório de trem, metrô e ônibus — sim, a conjunção é “e”, não “ou”). Nos fins de semana, pego com um pouco mais de frequência, e já era difícil andar a 70 km/h na pista central, por exemplo, porque eu sempre era um dos poucos a ficar dentro do limite, com carros passando a toda pelos lados e até grudando na traseira, mesmo quando eu não estava na faixa da esquerda, algo que tenho evitado cada vez mais. Na pista expressa, era um pouco mais fácil andar a 90 km/h, não sei dizer por quê. Pode até ser impressão minha.
Com os novos limites, eu seria a favor de radares a cada cem metros, pois aí, sim, o limite teria de ser respeitado por todos que não tivessem placas pretas, aquelas que dão ao motorista o direito de desobedecer leis de trânsito à vontade, mas este assunto é para outro dia.
Se a intenção da Prefeitura for mesmo a de diminuir mortes, especialmente por atropelamento, gostaria de ver a campanha em favor do respeito à faixa de pedestres ser retomada. Quando ela estava começando a funcionar de verdade, foi interrompida. Hoje ainda é mais fácil ser pedestre em São Paulo do que era cinco anos atrás, mas a diferença não é tanta, e os motoristas ainda insistem em ignorar as faixas listradas.
Enfim, não é um assunto simples, mas também não acho que a redução seja tão obviamente defensável quanto se apregoa. Abraço!